sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Regulamentação da Profissão de Produtor Cultural: Só depois da Mistura...

Agora existe o dia do Produtor Cultural! Sim, pelo menos no município de Niterói, foi instituído pela lei n° 2479 de 19 de outubro de 2007, no calendário oficial, o "Dia Municipal do Produtor Cultural". O mesmo será comemorado anualmente no dia 03 de maio.

E a pergunta é: Por que o dia 03 de maio?

Resposta: "No dia 03 de maio de 1995 o Conselho Universitário da Universidade Federal Fluminense aprovava a instalação do primeiro curso de graduação em Produção Cultural de todo o continente americano."

Então, conclui-se que a primeira graduação em Produção cultural justifica a escolha do “primeiro” dia do Produtor Cultural...

Depois de ler essa notícia e a própria lei, achei interessante postar aqui um dos assuntos "prometidos" de ser apresentado nesse espaço: a Regulamentação da profissão de produtor cultural.

É curioso observar como a polêmica aumenta, quando se coloca a graduação como critério, nesse debate. Muitas vezes, a graduação se confunde com o próprio debate.

Então, a questão não é mais a levantada no post anterior, “o que é um produtor cultural?” e, sim, se “precisa de faculdade para isso?”. Pergunta essa muito comum não somente por pessoas de fora da área, mas é principalmente levantada por muitos profissionais experientes e atuantes desse próprio mercado.

Lembro-me que, num seminário na Fundação Casa de Rui Barbosa, no ano passado, após uma das palestrantes apresentar seu trabalho de pesquisa da atividade da produção cultural, um produtor presente, no momento em que fazia sua pergunta, indignado ressaltou: “e tem gente falando em regulamentação por aí, que produtor cultural vai ter que ser formado”. Muitas pessoas presentes tiveram o mesmo posicionamento dele.

Se você entrar na comunidade do orkut de lei de Rouanet mais visitada – que, inclusive, recomendo - a maioria das pessoas que respondem às perguntas também são produtores experientes. Mas, diferentemente da postura acima descrita, a enquete passada da comunidade é justamente sobre esse debate da Regulamentação da profissão, em se ter um DRT de produtor cultural. A questão é que nada é falado em graduação. Pelo contrário, um dos tópicos na comunidade era exatamente chamando a atenção para a “falta de graduação” qualificada na área.

Já a visão dentro do ambiente acadêmico é bem distinta. Em conversas com amigos e professores da área, quando se fala em Regulamentação da profissão é quase que entendido como sinônimo a graduação em produção cultural. Obviamente, que não são todos que compartilham dessa opinião, mas muitos sim.

A aula magna ministrada, em maio do ano passado, pelo Ministro da Cultura Gilberto Gil ilustra bem esse contexto. O tema era: “Regulamentação da Profissão de Produtor Cultural e o papel da Universidade Pública na formação desse profissional”. Posso afirmar que depois do ministro ter ressaltado a importância da cultura com o processo da globalização, assim como, a própria participação da cultura no âmbito econômico, o eixo central das discussões e perguntas foram sobre o reconhecimento do produtor cultural em editais públicos, alias, o reconhecimento da graduação de Produção Cultural.

Nesse panorama, é válido ressaltar o “boom” de associações nessa área: ABEART, ABPC, ABCR, ABRAPE, a salada de termos que se misturam, principalmente conforme o local – dentro ou fora de uma universidade, dentro ou fora do mercado – tais como: produtor cultural, agente cultural, produtor executivo, captador, gestor cultural...

Sinceramente, o que mais tem me chocado não são os diferentes posicionamentos. Mas a falta de encontro, de diálogo para debate dos mesmos. Ausência de articulação entre as instituições e associações interessadas na questão. Um verdadeiro isolamento dos “atores” envolvidos. Conseqüentemente, uma ignorância, falta de conhecimento pelas partes e, mais agravante, o claro enfraquecimento da discussão.

Conforme o próprio ministro elucidou no evento descrito acima, “É normal que haja essa mistura entre os formalizados e não-formalizados, mas esta é uma questão que deve ser avaliada em debate nacional, assim como ocorreu em outros setores”. A questão pra mim é clara: Quando haverá essa mistura?

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Afinal, o que é um produtor cultural?

Bom, tive enorme dificuldade de escolher por onde começar, ao “falar” de produção cultural. A tentativa é que nesse espaço sejam colocados diversos temas em debates nessa área - marketing cultural, políticas culturais, as tão polêmicas e faladas leis de incentivo, etc, etc e por aí vai...
Mas, antes de escrever qualquer coisa sobre esses assuntos citados, resolvi dedicar esse primeiro post na busca de algumas respostas às perguntas “clássicas”, diria mais, às perguntas bem repetitivas no cotidiano de uma pessoa que tenha optado por estudar / trabalhar com produção cultural.
Quando decidi fazer um vestibular para Graduação de Produção Cultural da UFF, já no meu 4° período de Direito da UERJ, acredito que meu maior trabalho não foi estudar para relembrar a matéria e me preparar para prova, foi sim, responder aos meus pais, amigos, parentes... o que era um produtor cultural.
Tive que responder “não, não estou louca”; “não, não pretendo virar hippie”; “sim, pretendo viver disso”. Percebo que de 3 anos para cá...as coisas não mudaram muito. Continuo tendo que explicar o que um produtor cultural faz, do que vive, quanto ganha.
Tento explicar que a música que você escuta na rádio, o cd que você compra ou baixa na Internet, o filme que você assiste no cinema ou no dvd da sua casa, o livro que você lê, as peças teatrais, os festivais de música, literatura ou cinema, as exposições, os shows...enfim, tudo começou como um “projeto cultural” e, por trás disso tudo, existe, além do “artista / criador da obra”, a figura do produtor cultural.
O produtor cultural é um profissional que tem que ter a "sensibilidade" para se relacionar com artistas/arte, mas a praticidade e objetividade necessárias, para lidar com negócios. Sim, por mais que pareça distante a palavra "cultura" de "mercado", a produção cultural se sustenta com patrocínios, depende de balancetes anuais de empresas, assim como, lida diretamente com impostos (CPMF, INSS, ISS, IR...).
Não estou limitando a cultura ao mercado, mas deixo claro, que a mesma relaciona-se diretamente, também, com o último. Como falo muito com meu pai, “atualmente”, cultura diz respeito a todo brasileiro que paga imposto. As "polêmicas" leis de incentivo à cultura, sim, sim... estou falando da Lei Rouanet e da Lei do Audioviual (âmbito federal), a Lei do ICMS (nesse caso, estadual aqui do RJ e mais estados), do ISS (do município do Rio de Janeiro e outros). Então, essas que aparecem bem "pequenininhas" antes de começar um filme, ou nos cartazes de shows, peças de teatro. Já viu?
Pois bem, essas leis foram criadas para permitir que um produtor aprove seu projetinho cultural no órgão público responsável (MinC, Sec. estadual de Cultura ou Sec. Municipal de Cultura), depois apresente a uma empresa, e a mesma, no momento em que decide bancá-lo, tem parte desse valor descontado, nos impostos que deve ao governo. Compliquei?
Ok, ok, o que quero dizer é que com essas leis de incentivo, o governo divide a conta com as empresas no financiamento de projetos culturais - isso quando não paga a conta sozinho. E esse dinheiro do governo sai de onde? Pois é, sai do bolso de todo mundo que paga imposto. Portanto, querendo ou não, todos que pagam imposto -ainda que desconhecendo - estão contribuindo, desde 1986, com o financiamento da produção cultural brasileira.
Vou exemplificar, sabe aqueles shows na praia que a Prefeitura promove “gratuitamente” com atrações internacionais? O dinheiro para isso saiu do seu bolso em impostos. Sabe o CCBB? Sim aquele centro cultural do Banco do Brasil. Então, tudo o que o Banco do Brasil investiu ali foi descontado do imposto que ele pagaria ao governo. Um exemplo mais atual? O Cirque du Soleil, com ingressos de até R$370, que o Bradesco “patrocinou”. O mesmo teve R$ 9,4 milhões descontados no valor do imposto que pagaria ao governo. Pois é, o governo deixou de arrecadar R$ 9,4 milhões, que poderiam ir para saúde, educação, ou diversos outros projetos culturais (com ingressos mais baratinhos), para dividir a conta do cirque du soliel com o Bradesco. Dar uma forcinha naquele comercial do palhacinho sorridente. Já viram?
Mas, vamos voltar à questão do Produtor Cultural.
Então, como disse anteriormente, tudo começa com um projetinho cultural. Simplificando bem, este projetinho é um plano de negócios, com estratégias de comunicação - programação visual, estratégias de divulgação, assessoria de imprensa -, planos de captação, orçamentos, cronogramas e, obviamente, tem como “foco” a proposta e conceituação de um objeto/produto cultural (exposições, shows, filmes, cd’s...).
Se você abre um jornal, à procura de algo para fazer no final de semana, e tem muitas opções, agradeça aos benditos produtores culturais que desenvolveram projetos culturais para sua cidade. A realidade é que no Brasil, a maioria das cidades, sobretudo as do interior, sofrem pela “falta de do que fazer”. Quando tem cinema, só tem a opção de 1 ou 2 filmes passando, não tem peças de teatro, não tem shows... estou sendo repetitiva, né?
A contradição é que muitas dessas cidades têm diversidade e potencial cultural abundante, mas desperdiçado. Têm até uma “secretaria de agricultura, esporte, lazer e cultura” também responsável, têm os meninos com bandas de garagem, as senhoras que pintam quadros, pessoas que fotografam e, se tivessem câmeras na mão então, porque não curtas produzidos pelos próprios moradores, para eles mesmos. Mas, o que falta então?
De novo, vem o produtor cultural. O responsável por reunir essas bandas num festival, por exemplo, tirando-as da garagem, o que pode até contribuir com a divulgação da cidade. É ele que articula o intermédio entre os fotógrafos/cantores/pintores/atores, enfim os artistas, com os espaços, e com o comércio e empresas locais. É o profissional que pode ser responsável por propiciar aqueles moradores conhecerem produção de fora, de outras cidades e, acima de tudo, da sua própria região.
Acho que escrevi bastante, né? Os corajosos e pacientes, que conseguiram ler até o final, tem aqui meus agradecimentos.
Depois dessa extensa introdução, deixo para um próximo post a discussão da Regulamentação da Profissão, as Associações, as graduações de Produção cultural, cursos especializados, o embate entre Produtores formados X Produtores não formados, nesse cenário.